Hoje em dia, é fácil. Um clique no Google-Imagens e lá está a foto de quem queremos saber como é. Mas, em 1979, a coisa era bem diferente. Tinha de montar na concepção fantasiosa aquela que tanto me encantava com seus textos e suas atitudes.
Aqui, um parêntese. O ano, 1979, para mim, foi o que mais tatuou minha mente e meu coração. Me sentia sinceramente importante por ser membro de um partido político clandestino. Acreditava estar inscrito em todos os dossiês dos órgãos de repressão como perigoso agitador. Há pouco, dei uma busca nos arquivos do DOPS - nem homônimo meu tinha lá. Uma ducha fria na perspectiva da imortalidade.
Para o mundo, também, foi um desses anos incomuns. Os sandinistas tomaram a capital da Nicarágua e a América Latina conheceu uma segunda vitória de forças guerrilheiras populares. Os dois, porém - Nicarágua e América Latina - eram (e são) espaços de importância secundária no interesse da geopolítica mundial. O que estremeceu os impérios foi o que aconteceu antes. No Irã, triunfou a revolução islâmica. Ao contrário da esquerda geral, odiei aquela porra toda. Milhões de fanáticos nas ruas fazendo genunflexão, mulás brandindo metralhadoras, turbantes como símbolos de poder e, principalmente, aquele velho caquético – aiatolá Khomeini – comandando um fantástico frenesi medieval.
Eu tinha gana de Khomeini. Para mim, um escroto que atrasaria a história em quinhentos anos. Alguém precisava dar uns tapas na cara do gagá barbudo. E os EUA, humilhados, não deram.
Quem me vingou foi uma jornalista italiana de 50 anos. Oriana Fallaci,
Sabe-se lá como, Oriana conseguiu uma entrevista com o velhinho filho da puta. Para tanto, teve de botar um véu sobre a cabeça. Papo vai, papo vem, e Oriana começou a questionar a lógica do chador (o véu). Num momento qualquer, irritado, Khomeini disse que o chador não era para ela mas, sim, para as mulheres crentes e respeitáveis. Aí, Oriana revidou com juros e correção monetária. Ah, é? Então eu não tenho porque usar este pano idiota. E, na frente do Imã, arrancou o véu. Khomeini fez uma careta e saiu da sala. No dia seguinte, convidado por uma Oriana insistente, voltou a conversar com ela sobre suas idéias de jerico.
Oriana era assim: respeitava apenas sua própria consciência.
Aos 38 anos já era considerada a melhor jornalista européia, Entrevistara Kennedy, o ditador vietnamita Cao Ky, Marlon Brando, Ingrid Thulin. Você sabe quem é Ingrid Thullin? Nem eu. Mas ela entrevistou. E sempre do seu jeito. Pulverizando o ponto fraco dos entrevistados. Não estava nem um pouco preocupada em fazer amigos ou agradar quem quer que fosse. Henry Kissinger disse que a maior estupidez de sua vida foi aceitar ser entrevistado por Oriana Fallaci. Ninguém saía sorrindo depois de meia hora de um papo com ela.
Sua grande paixão (que inveja!) foi o ativista grego Alekos Panagoulis, que tentou matar o ditador grego George Papadoupolis. No ótimo livro “Um Homem”, Oriana fala sobre Alekos. Era, além de tudo, uma ótima escritora. Os resultados de suas entrevistas não vinham sob a forma medíocre perguntas-respostas. Oriana montava um texto e colocava apenas aquilo que era realmente importante do cara que ela havia confrontado. Em 1968, foi ferida a tiros de metralhadora durante uma manifestação de estudantes mexicanos. Cobriu a guerra do Vietnam fazendo questão de estar sob fogo cruzado, muitas vezes gravando suas impressões deitada no chão com as balas zunindo sobre sua cabeça.
Uma mulher que o mundo não fez mais. E não era feia, muito pelo contrário: um tesão.
Lindinho, a Oriana realmente criava a história com a entrevista feita. O Khomeini era um imbecil, seguido por malucos mal comidos e mal resolvidos.
ResponderExcluirBjussss
Ótimo texto, excelente escolha, péssimo título. Realmente, uma mulher extraordinária. Cerca de um ano depois de entrar para o Bando do Brasil, peguei emprestado na biblioteca do BB o livro Um Homem, que não conseguia largar nem ao almoçar no bandejão, antes do expediente.
ResponderExcluirA biblioteca ficava no último andar do prédio da agência Centro Rio, onde hoje é o CCBB. Ou seja, nunca saiu do lugar, apesar das ameaças, na época, do banco de transferí-la para Brasília. Os funcionários pediam através de um formulário e os livros chegavam via malote.
Para honrar o título ridículo, tenho certeza de que O que provoca vai acabar falando de Tina Modotti, outra italiana internacional
Atrasadinho, diga-me existe aí uma queda por italianas ??? Vocês são surpreendentes.
ResponderExcluirProvocador, vou enviar a receita de Peru ao wiske, assim que acha-lá.
Bjussss
Bem, quem caiu na armadilha, surpreendentemente, foi o meu querido Eduardo.
ResponderExcluirO "comer", no título, não se inseriu no sentido do "conhecer biblicamente".
Gostaria, sim, de ter comido a Fallaci no sentido dado pelos guerreiros tupinambás: devorá-la para incorporar sua valentia.
E foi apenas o primeiro de série.
Me aguarde.
Beijo
PS: No aguardo, hein, Cassinha?!
"No aguardo"? Com a palavra, o nosso bacharel em letras...
ResponderExcluirComo são as coisas... Eu, pessoalmente, não gostei do romance citado pelo que sempre chega depois. Me pareceu uma apologia pouco convincente...
ResponderExcluirMas esse negócio de falar de italianas eu acho muito bom!
Acho que está correto o "no aguardo". Eu "aguardo" e estou nesse estado de expectativa - "no"
ResponderExcluirMas o que o bacharel falar, acato.
Aguardando..
Cassinha, por favor, eu não bebo uísque, mas a receita é fabulosa... a original.
ResponderExcluirOk, eu me rendo, O que provoca quer mesmo é Fellaci no sentido tucupinambá do termo.
O romance que citei, ô sem problemas de agenda, foi citado, na verdade, pelo que provoca.
Eu nunca falei nada de português, a não ser na crítica ao texto da doutora de.
Parece que a Marília já chegou a Búzios... estou no aguardo.
Aí, véio...
ResponderExcluirMeu título seria: "Mulheres, algumas até feias, que eu teria me apaixonado loucamente". Tá certo, que este título é sugerido por alguém não tão consistente quanto o autor, do ponto de vista machista latino, mas é mais romântico e nele "tudo" está implícito...rs. Agora, o filo é ótimo...vai nessa. No aguardo dos próximos.
Bj, véio...
O que provoca queria comer a Fallaci no tucupi!?
ResponderExcluirE onde entra o pato?
Dependendo da flexibilidade do provocador, está à disposição na Itália (ôpa!) um pato que é um frangote. Chama-se Alexandre e joga no Milan.
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