Esta tarde, eu, sem nada muito interessante para fazer, estava zapeando pela internet como sempre faço, e encontrei por acaso um texto discutindo as políticas governamentais no controle do narcotráfico e sua relação com o bem-estar da sociedade. Sei que o tema é velho, porém tive o prazer de descobrir na argumentação do autor pontos significativos e que não costumam ser abordados na discussão do tema. Posto aqui o texto integral:
"A guerra contra as drogas, e contra o bom-senso econômico, por Nilo B. P.
Com o desaquecimento econômico global, parece que se multiplicam pelo mundo afora iniciativas pela legalização de drogas recreativas. A surpresa mais recente veio quando uma comissão internacional formada por figuras políticas eminentes, citando dados da ONU, chamou a guerra contra as drogas de um “fracasso”.
Os nomes na comissão não são de ativistas rastafarianos caricatos, e a ONU não é nenhum paladino imparcial. Estas são pessoas que defendem o uso da mão estatal para resolver problemas sociais de todos os naipes, e não têm nada em princípio contra a proibição de uma mercadoria ou outra, se acharem que pode sair algum “bem social” de tal política. Por que, então, tantos intervencionistas de respeito estão se voltando contra o conceito que tem definido a política criminal de Estados ao redor do mundo desde o século passado?
Não se trata de iluminação repentina. O pântano econômico mundial também torna mais difícil a vida dos governos, e nos países desenvolvidos, décadas de expansão fiscal e promessas imponderadas de “benefícios” aos eleitores estão batendo à porta com uma força crescente. Os políticos mais previdentes estão à cata de programas supérfluos que possam ser cortados com um mínimo de dor.
Políticas supérfluas não faltam, mas aqui focamos em uma das mais universais e destrutivas, a guerra contra as drogas. Assim como dirigir sem cinto de segurança, ter uma vida sexual promíscua, fumar e beber, poucas coisas boas podem ser ditas sobre o hábito de usar drogas para se divertir. No entanto, quanto a maus hábitos no trânsito, e drogas geralmente aceitas, o governo procura estimular aquilo que é visto como um comportamento desejável taxando o vício. A prostituição, um assunto de certa maneira mais sensível do que drogas, é de jureproibida, mas de fato aceita. Apenas o uso de drogas é objeto de repressão direta.
Os usuários são vistos como marginais, um preconceito que tem os seus méritos; mas é a criminalização das drogas que tornam seus usuários foras-da-lei. Pode-se argumentar que existe uma associação entre drogas e crimes violentos; realmente, está bem estabelecido que usuários de drogas são, ceteris paribus, mais propensos a comportamentos indesejáveis, e até mesmo violentos, do que os que não o são. No entanto, a maioria esmagadora da violência diretamente associada com drogas não é resultado de drogados irresponsáveis, mas da proibição em si.
Não há qualquer argumento plausível a favor da idéia de que o tráfico, com todos os seus aspectos tenebrosos, é algo intrínseco a narcóticos. Onde quer que se verifiquem práticas escusas associadas com o comércio de uma mercadoria, pode-se ter certeza de que o Estado está tentando controlá-lo – se pepinos fossem proibidos, logo os empreendedores com menos escrúpulos começariam a matarem-se uns aos outros pelo direito de controlar o tráfico de legumes. Pode parecer estranho usar a palavra “empreendedores” para descrever pessoas de caráter tão duvidoso, mas isso é justamente o que são.
A guerra contra as drogas é um ícone de como o governo gasta recursos para tornar nossas vidas piores. Tudo que compramos com nosso dinheiro encaminhado à repressão do comércio e uso de drogas é um aumento da violência e corrupção; além disso, diga-se de passagem, tornar as drogas ilegais apenas tende a atrair indivíduos (geralmente adolescentes e jovens) procurando experiências perigosas e excitantes para essas substâncias, ao mesmo tempo em que repele os potenciais usuários mais responsáveis.
Se a proibição das drogas é tão ruim, por que não foi descartada antes? – pergunta o conservador. Realmente, quando falamos do mercado, esse é um ótimo ponto. Afinal, essa é a mecânica por traz de lucros e prejuízos, expansão e falência: aqueles que melhor usam os recursos escassos à disposição da sociedade são recompensados e encorajados; aqueles que desperdiçam tais recursos são penalizados e, caso se apeguem à sua estratégia malsucedida, eventualmente serão forçados a se retirar.
Este é um ponto importantíssimo. Uma das grandes virtudes do mercado é forçar sonhadores a lidar com a dura realidade. Mas as pessoas tendem a mudar radicalmente quando vão de consumidores a eleitores. Os custos são pulverizados, e os resultados estão distantes. A realidade do bolso dá lugar a opiniões levianas. Como diz o ditado, falar é fácil. É por isso que o argumento conservador – “se é assim, deve haver um motivo” – é uma falácia no caso de políticas governamentais.
Na verdade, as políticas estatais mal-sucedidas tendem a receber mais recursos. Para um exemplo pouco controverso, basta ver o sistema financeiro mundial: a pesada regulação aplicada a esse setor em todos os países falhou fragorosamente em prevenir a crise de 2008, e outras antes dela. Mas ninguém questionou a eficácia ou a sabedoria do sistema regulatório: ao invés disso, o poder das agências reguladoras foi ampliado.
Felizmente, nem mesmo o Estado é imune à perpétua maré da realidade. À medida que políticas mal concebidas tornam-se mais destrutivas, passando a afetar a vida daqueles que antes eram indiferentes ou mesmo as apoiavam, a opinião do eleitorado começa a mudar. Para algo tão universal como a guerra contra as drogas, mesmo a obviedade do horror causado pela política pode demorar uma geração para levar ao fim da mesma, pois as pessoas demoram a admitir, para o mundo e para si mesmas, que estavam tão erradas.
O mercado também está atacando com firmeza crescente o lado do custo da guerra contra as drogas. À medida que as dívidas públicas atingem patamares cada vez mais preocupantes, políticos como os da Comissão Global sobre as Drogas, e seus representantes burocráticos como os da ONU, procuram programas supérfluos para serem cortados. Ao mesmo tempo, os governos ameaçam subir impostos para lidar com o déficit, e o eleitorado, finalmente com o bolso ameaçado, passa a questionar a necessidade de certas políticas.
Há poucas dúvidas que a virtude requer que combatamos o vício das drogas, as quais afetam forte e negativamente as vidas de muitas pessoas. Mas trata-se de um problema privado e delicado, como aqueles próximos a usuários podem bem atestar. O governo, que em última instância é a institucionalização da violência, é o pior agente possível para intervir em nome das famílias e dos jovens."
Link do artigo: http://libertarianismo.org/index.php/academia/15-artigos/314-a-guerra-contra-as-drogas-e-contra-o-bom-senso-economico
Muito bom o texto.
ResponderExcluirCuriosamente, o primeiro cara que me deixou clara a necessidade de descrminalizar foi o arquiconnservador Milton Friedmann.
Liberais e libertários se encontrando no bom senso.