RAUL SEIXAS MAL EXUMADO




Fui ver o documentário “Raul – O Início, o Fim e o Meio”, roteiro de Leonardo Gudel. Bonequinho do Globo aplaudindo de pé e cotação ótimo, quatro ovos, no Omelete - o site favorito da minha cria.

Gostei, com a ressalva de não compartilhar do entusiasmo da crítica.

De maneira geral, para mim, os documentários costumam ser as camisas polo da indústria cinematográfica. Legaizinhas, agradáveis, frescas, cores e estampas variadas etc mas nunca escapam daquela golinha e da abertura superior com os dois botõezinhos. Assim foi o “Raul”. Depoimentos das ex-mulheres, dos parceiros, dos amigos, dos fãs, dos jornalistas, recortes de cenas da vida e do palco, retalhos das músicas mais significativas... e o resto foi lavagem de mãos. Um computador bem alimentado faria a mesma coisa . Vai ver por isso o Michael Moore dá banho de bola no clube. Ele se mete na história, vira personagem, dá palpite e não foge do pau. Estou meio de saco cheio do papo esquivo na base do os-fatos-estão-aí-tire-sua-própria-conclusão.

Raul Seixas não foi decifrado e acabou devorando os autores. E, de quebra, a platéia.

Saí do kinoplex do mesmo tamanho que entrei, embora com mais saudade. Fiquei sem saber o que era, afinal, a tal proposta de Sociedade Alternativa – que, segundo o Paulo Coelho, só teve, efetivamente, quatro membros: eles dois e mais as mulheres de cada um.

Também não consegui entender direito se ele foi mesmo preso pela Ditadura ou se só tomou umas bordoadas e foi obrigado ao exílio à força, como Caetano e Gil. Novamente veio o Paulo e disse que quem entrou em cana no duro foi só ele. O fato é que “Ouro de Tolo”, a melhor e mais completa música de protesto que este país já ouviu, nunca foi proibida. Sofisticada demais para a boçalidade dos censores, sutil demais para provocar comoções coletivas num lugar onde o analfabetismo político é a condição normal. Acredito que Raul Seixas sabia muito bem disso e aproveitou pra sacanear deus e o mundo. Literalmente. Só de sacanagem, brincou de adorar o Diabo. O álbum “Krig-Ha Bandolo” era nada mais que um Tarzan reduzindo os gorilas do regime militar a pó de mico. Até hoje invocamos, dele, “Metamorfose Ambulante” para justificar posições novas.

A Ditadura estava preocupada com Chico Buarque, Gonzaguinha, Milton Nascimento e por aí. Mas a verdadeira mosca na sopa era o Raul.

Acho que faltou muito do compreender a essência no documentário. Uma vez, perguntado como teria sido o processo de criação de “Ouro de Tolo”, Raul respondeu: “Eu estava na varanda, fumando. E, então, veio um disco voador e entregou música e letra prontinhas na minha mão.”

Ainda não sabemos quase nada sobre aquele cara. Que ótimo. O enigma continua.

Comentários

  1. Acho que me esqueci de dizer o que é que o Raul estava fumando na varanda. Na verdade, nunca soube. Mas sempre quis unzinho da mesma colheita...

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