Afinal, Lula ainda seria, nem que por falta de alternativas, uma liderança viável para se conseguir alguma espécie de "virada" na situação desastrosa em que vem afundando o Brasil?
A falta de uma opção política ao lulismo, dotada de um programa mais à esquerda e capaz de competir com ele pela representação dos interesses populares na arena da luta de classes é, infelizmente, tão real quanto trágica.
Esta ausência, no entanto, não é problema nem do Lula e nem do PT. É um problema da esquerda não lulista, que não soubemos até agora resolver. Nenhuma solução para esta tragédia virá de quem não sequer a reconhece como um problema.
De tudo o que Lula vem declarando desde sua soltura, ele deixou claro que visava, primeiro, reconstruir o bloco no poder que o sustentou por tanto tempo. Com todos os Renans, Kátias Abreu, Meirelles, Collors e que tais que ele pudesse atrair. Toda e qualquer alusão que ele já fez a "erros" cometidos pelo PT na presidência, os quais nunca são explicitados, são, no máximo, de natureza tática, nunca estratégica. Mais recentemente, no entanto, ele passou a dizer que não aceitaria compor com as "elites" numa próxima candidatura para presidente em 2022.
Porque a mudança no discurso?
Primeiro, simplesmente porque ele finalmente assumiu que o bloco no poder que o sustentou por tanto tempo esgarçou-se de maneira irreparável. Tanto, que sua pregação não atraiu nenhum dos cortejados. Todos os "aliados" que o Lula desejava desesperadamente reconquistar apoiaram as deformas do Temer quando ele estava na cadeia e agora apóiam a política econômica de Guedes e Bolsonaro. Quaisquer que fossem os farrapos que Lula tivesse podido remendar daquele tecido puído, o remendado seria muito menor do que era, e o preço do serviço de remendão seria manter, em essência, o conteúdo das deformas e das políticas anti-povo. Por isso ele não assumiu antes o "Fora Temer", nem agora o "Fora Bolsonaro". E não é por outro motivo que ele já disse claramente que "nada poderá fazer se não tiver maioria no Congresso" e que, se voltar a governar, o fará "olhando para o futuro e não para o passado". Até porque, parafraseando o que Milton Temer disse hoje sobre o Paes, no passado estão todas as cagadas que ele fez na aliança preferencial com a cleptocracia do MDB...
Segundo, porque ele torna a insinuar que será candidato às eleições para presidente em 2022. Não será, pelo mesmo motivo que não foi no pleito passado. Ensaia repetir a mesma patacoada de 2018, e numa conjuntura ainda mais negativa do que a anterior, o que faz com que esta "tática" seja ainda muito mais perigosa hoje do que já provou ser ajudando o Bolsonaro a se eleger.
E por quê mais perigosa?
Perigosa porque a insistência em uma perspectiva estratégica já esgotada (o pacto conservador com conflito zero) continua a inibir o surgimento de novas estratégias e táticas alternativas à mera conciliação de classes no campo hegemonizado pelo lulismo, que é maior do que o próprio PT, e que também hegemoniza outros setores da esquerda.
E ainda mais perigosa do que antes porque a continuidade da tática suicida da falsa candidatura de Lula deixa Guedes, Bolsonaro e seus comparsas à vontade por mais de dois anos para fazerem o que lhes der na telha, da mesmissima forma que deu antes a Temer toda a tranquilidade do mundo para fazer o que fez. O povo, que já tivera de aguentar dois anos na merda, do impeachment até a prometida eleição redentora de Lula em 2018, que deu chabu, e que permanece sofrendo com Bolsonaro ampliando ainda mais a merda depois de eleito, ainda terá, esperando o Salvador, de suportar por mais de dois anos de merda até 1922?
Nada e nem ninguém obriga a esquerda não lulista a permanecer pastando sob a guarda do Lulu-Livre, a não ser a debilidade política, programática e ideológica dela mesma. Ou ela rompe com a hegemonia lulista, como é seu dever e responsabilidade, ou vai pro ralo.
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